domingo, 14 de março de 2010

Istambul: Um Olhar Português

Por João Romão, realizador do documentário "Turquia - Vizinhos: O Outro lado da Europa" in Barlavento.

Istambul é uma cidade com um ritmo intenso: quase 14 milhões de pessoas em movimento por uma cidade imensa que se distribui por dois continentes, com grande peso da população jovem e enorme diversidade de origens, difícil de encontrar noutras geografias: além dos turistas das mais variadas proveniências, a população turca inclui as minorias grega, arménia ou curda. São vários os “centros” desta metrópole cosmopolita mas a zona envolvente da Praça Taksım e da Rua Iskiklal (o bairro Beyoğlu) será a mais emblemática: muitas lojas (incluindo as marcas e cadeias de franchising de referência na Europa) e muitos cafés (para saborear chá ou café turco e fumar “narguilés”). Muita vida ao ar livre, nas ruas e nas esplanadas. 

A noite mostra-nos outra faceta desta vida intensa: os restaurantes abertos até muito tarde, as peixarias que continuam a vender peixe junto aos restaurantes meyhane (uma refeição tradicional feita de tapas e peixe frito ou grelhado devidamente acompanhados com raki, o licor anisado típico da Turquia), os bares e discotecas que ocupam diferentes pisos e terraços dos edifícios, a diversidade musical em altos decibéis (da música tradicional à house-music ocidental, passando pelo pop e pelo rock que nos são familiares). 

A população turca é bastante jovem e isso nota-se mais à noite, todas as noites, na convivência de homens e mulheres, animados pelas mesmas bebidas que encontraríamos em qualquer cidade europeia.

Istambul é também uma cidade com grande actividade turística, num país que está entre os dez maiores destinos de viagem no mundo, quer em termos de visitantes, quer de receitas. As grandes cadeias hoteleiras marcam presença com modernos e altos edifícios com vista sobre o Bósforo, o estreito que liga o Mar do Norte ao Marmara (ligado, por sua vez, ao Mar Egeu) e que divide a cidade, separando a Europa da Ásia. A zona da Mesquita Azul e do Museu de Hagia Sofia, onde também se encontram o Grande Bazar e o Bazar das Especiarias, é a mais procurada pelos turistas e aí se evidencia a diversidade dos visitantes do país: são pessoas de toda a Europa, incluindo a de Leste, do Médio Oriente, do Japão ou dos Estados Unidos, à procura do exotismo da antiga Constantinopla. 

As deslocações não são difíceis: há linhas de metro, subterrâneo ou de superfície, táxis colectivos e outros tradicionais, com preços acessíveis. Fora destas zonas centrais, mas noutros bairros modernos da cidade, encontram-se os grandes centros comerciais, com ambientes e lojas semelhantes a quaisquer outros, mas com uma importante diferença: para entrar, é preciso passar pelo detector de metais. 

A Turquia tornou-se o único país de maioria muçulmana a ter um Estado laico, quando Atatürk instituiu a República e separou os poderes: a religião submete-se ao controle do Estado e não tem peso na decisão política. Oitenta anos depois, está no poder o AKP, o partido turco com maior influência das normas islâmicas, mas essa influência não é particularmente evidente em Istambul, apesar dos cinco chamamentos diários para as orações que se podem ouvir a partir dos minaretes das mesquitas que se distribuem por toda a cidade. 

Mas se em Istambul se respira liberdade e uma efervescente vida social e cultural (muitas galerias e museus, muita música, muitos cinemas, com grande produção nacional) nem todo o país será assim. É o que me dizem os amigos e acabei por confirmar em Diyarbakır, na zona sudeste, perto da fronteira com o Iraque, na zona maioritariamente habitada por Curdos: aqui sim, quase todas as mulheres usam véus e o consumo de bebidas alcoólicas é muito reprimido (mesmo os estabelecimentos autorizados evitam a sua venda, para não chocar os hábitos tradicionais). 

A Turquia também é feita destes contrastes.

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